Por que poucos profissionais prescrevem cannabis?

Por que poucos profissionais prescrevem cannabis?

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As colunas publicadas na Cannalize não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem o propósito de estimular o debate sobre cannabis no Brasil e no mundo e de refletir sobre diversos pontos de vista sobre o tema.​

Atualmente, um dos requisitos para uma pessoa poder plantar cannabis medicinal, é a indicação do médico. No entanto, a maioria dos profissionais ainda são resistentes quanto aos efeitos da planta.

A cannabis possui uma série de propriedades medicinais, podendo ajudar no tratamento de diversas doenças, que variam desde asma até crises convulsivas. Isso graças aos canabinóides, que agem no cérebro e também por todo o corpo, auxiliando nas funções a nível celular. Mas por que então ela é pouco recomendada pelos profissionais? Seria a restrição da planta no país?

No Reino Unido, a lei foi alterada a mais de um ano, por isso os médicos podem prescrever cannabis livremente. No entanto, ainda são pouquíssimos profissionais que indicam o uso.

Para discutir esta questão, o Cannalize conversou com a Shephanie Lins, que trabalhou na área da saúde em alguns países onde a cannabis é legalizada e usada tanto na medicina quanto como produto recreativo e viu de perto como a cannabis é tratada. Hoje ela está se especializando em fitoterapia e também no sistema endocanabinóide.

A enfermeira começou se interessar pela cannabis depois que soube que ela podia tratar a sua epilepsia. Sem muitos estudos no Brasil, ela foi para Amsterdã pesquisar mais sobre a planta e quando voltou, se fez como “estudo de caso” e usou a cannabis para o seu problema.

Lins destaca que os estudos sobre as propriedades medicinais da cannabis ainda são relativamente novos, por outro lado, cada vez mais as pessoas estão conhecendo a planta e o que ela pode fazer.

Veja abaixo a entrevista completa.

Por que você acha que a maioria dos profissionais brasileiros ainda não prescrevem cannabis?

A ciência só veio descobrir que nós temos um sistema endocanabinóide, a partir de 1994. Então saber que podemos utilizar a maconha para tratarmos algumas doenças e condições ainda está num processo constante de descoberta e aprimoramento.  Desde lá já se formaram muitos médicos que não fora instruídos e ainda não tiveram acesso à materiais de qualidade justamente porque a cannabis estava bloqueada pelo sistema como droga ilícita. A cannabis ainda é “uma droga perigosa” culturalmente.

A cannabis é uma planta que tem mais de 2 mil anos A.C., uma das plantas mais primitivas já conhecidas. Então por que esta planta está em vários locais do mundo e por que ela é bloqueada em alguns lugares e outros não? cultura. Inicialmente por conta da cultura.

Mas hoje as pessoas estão começando a ter uma nova visão sobre a cannabis. Ela deixou de ser uma planta? Não, ela ainda é uma planta. Só que hoje nós temos mecanismos diferentes para entendê-la melhor que no passado, como microscópios mais atuais. A medicina vai mudando de acordo com o mundo, tudo vai se atualizando.  Se o celular se atualiza, por que não as fórmulas químicas?

Essa nova visão começou pelo número de casos crescentes de pessoas utilizando e tendo resultados ou por que os cientistas quiseram saber mais sobre a cannabis? O que influenciou mais?

Na verdade, tudo ajudou. A tecnologia vem avançando e dando motivos para estudar novas doenças. Pessoas com deficiências de canabinóides, por exemplo, que é o que vem acontecendo nos Estados Unidos, e é justamente por isso que estão vendo as potencialidades dessa planta.

Agora é impossível as pessoas não saberem os benefícios da cannabis. Porque as pessoas estão postando, mostrando. Hoje em dia nós temos a tecnologia na nossa mão. (…) As pessoas têm mais acesso à informação do que antes, então não vai ser um “jornalzinho” simples que vai mostrar para a gente o que a planta tem. Hoje a gente pode entrar nos sites de pesquisa ou a gente pode simplesmente plantá-la e observar se ela vai ou não fazer efeito.

Você acha que vai demorar muito para o sistema endocanabinóide entrar nas universidades?

Pode demorar um pouco, pois eles ainda estão estudando a “distância”, digamos assim, deste sistema. Pode ser que o sistema endocanabinóide seja obrigatório daqui uns cinco anos.

Você acha que os médicos ainda têm um certo preconceito por ser um fitocanabinóide e não aquilo sintético feito em laboratório?

Sim, pois muitos médicos estão juntos com a indústria farmacêutica. Eu posso falar isso porque eu já estive na área de vendas, na área de representação de remédios e na área também de representação cirúrgica, eu sei muito bem como funciona. (…) O sistema é muito complexo, existe uma corrupção ativa entre os médicos, os farmacêuticos, os representantes farmacêuticos e entre as empresas de grande porte.

A indústria farmacêutica não tem muito interesse na cannabis, pois a cannabis salva e a farmácia quer te manter doente. Então não tem interesse em fazer um sintético de cannabis, a não ser que mude a formulação dela por completo.

Por outro lado, as plantas são complexas, pegar uma substância isolada para estudar dá trabalho. São anos e anos de pesquisa, ainda mais uma planta que tem 400 fórmulas, não é tão fácil. A ciência precisa provar muita coisa ainda. Então não adianta a gente querer meter os pés pelas mãos, a gente tem que ter paciência, pois os efeitos colaterais existem, não só do sintético como também das plantas.

Mas terceirizar uma empresa para fazer um remédio de uma planta, ao meu ver e ao ver de muitos, é uma coisa errada. Porque liberar para uma empresa ganhar dinheiro de uma planta, de um remédio eu posso fazer em casa e que não vai custar nada, apenas o valor da semente, é um absurdo.

“Porque uma planta não tem patente. Você não pode usar de uma planta e pagar por ela como uma música, onde eu tenho que pagar direitos autorais. A planta é da natureza, você não pode privatizar uma planta que não é sua, é da natureza. Foi Deus que plantou e Deus não cobra por isso.”

 

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