“Eu sou farmacêutica, pesquisadora, mas acima de tudo, eu sou paciente”

“Eu sou farmacêutica, pesquisadora, mas acima de tudo, eu sou paciente”

Sobre as colunas

As colunas publicadas na Cannalize não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem o propósito de estimular o debate sobre cannabis no Brasil e no mundo e de refletir sobre diversos pontos de vista sobre o tema.​

A cannabis entrou na vida da pesquisadora através da fibromialgia. Hoje, a planta também faz parte dos seus estudos e até do seu trabalho 

“Eu sou farmacêutica, pesquisadora, mas acima de tudo eu sou paciente”
Foto: Arquivo Pessoal

Quem vê a farmacêutica, Vivian Dalla Colletta hoje, nem desconfia de tudo que teve que enfrentar. Passando por um pós-cirúrgico para a remoção total do intestino, a pesquisadora foi uma das coordenadoras do segundo CicMed, um congresso especializado em cannabis medicinal para profissionais de saúde que aconteceu neste ano.

Com os seus cabelos curtos, Dalla esteve de lá para cá durante os quatro dias de evento, como se nada tivesse acontecido. Não foi à toa que as pessoas se espantaram quando a pesquisadora falou que estava com câncer.

Diagnóstico de fibromialgia

Vivian Dalla Colletta, sempre sentiu dor. Na verdade, ela nem se lembra se algum dia conviveu sem dores que percorriam por todo o corpo. Os exercícios físicos e a alimentação as tornava até toleráveis, mas as coisas mudaram após um imprevisto.

Em 2013 ela sofreu um acidente de moto e quebrou o braço, foi quando perdeu o controle. “Na minha primeira cirurgia, estava doendo o corpo inteiro, era fora do normal, não era só o braço quebrado”, relata.

Não demorou muito para vir o diagnóstico. Fibromialgia

Trata-se de doença crônica e sem cura, caracterizada principalmente por dores fortes por todo o corpo, além de outros sintomas. Por muitas vezes, ela está relacionada a fatores emocionais, como ansiedade, depressão e estresse. Outras vezes, pode ser ocasionada por fatores do sistema nervoso.  

Por não ser totalmente compreendida ela ainda gera muitos estigmas e preconceitos. As dores “inexplicáveis” podem gerar um sofrimento solitário, que por vezes, pode piorar problemas psicológicos. E não são poucos os que sofrem com a doença.

O problema afeta de 4% a 6% da população global, de 18 a 65 anos. No Brasil, ela atinge cerca de 3% da população, isso significa quase 7 milhões de brasileiros, principalmente mulheres de 35 a 44 anos.

Lesão no nervo

A farmacêutica até conseguiu controlar as dores com exercícios físicos. Mas as coisas  voltaram a sair dos trilhos quando a pesquisadora se viu em um novo ocorrido que mudou completamente o rumo da sua vida. 

Em 2015, enquanto trabalhava em uma indústria farmacêutica, ela teve uma apendicite e foi internada às pressas. Fez uma cirurgia, mas os médicos lesionaram um nervo da sua perna durante um procedimento. Lesão que ela só foi descobrir alguns anos depois.

“Eu perdi completamente o controle da dor. Tinha picos em que eu desmaiava, tinha crises de ausências e o negócio ficou bem feio. Desmaiava no trabalho, na rua, rodoviária, aeroporto, onde eu tivesse”, complementa.

Foi então que começou a saga. Dalla precisou passar por 10 médicos diferentes, tomar até quatro tarjas vermelhas, mas nada melhorava. Chegaram até a questionar se a sua dor era mesmo real ou psicológica.

Foram dois anos para descobrir a tal lesão no nervo da perna, mas isso não queria dizer que estava tudo resolvido. As dores ainda continuavam e nenhum médico conseguia tratar o problema. 

Fazendo o óleo de maconha na cozinha de casa

Foi em um de seus surtos, que a pesquisadora se lembrou de pacientes dos Estados Unidos com câncer que amenizam as dores com a cannabis e resolveu que iria fumar maconha

“Eu sou uma farmacêutica careta, nunca pus um tabaco na boca, não bebo nem refrigerante”, brinca.

Mas Dalla estava desesperada. Quando falou para o seu irmão ir atrás de maconha, ele riu da sua cara.

Tentou fumar o prensado mesmo, mas não deu certo, não estava acostumada. Foi então que a farmacêutica teve a ideia de fazer o óleo da planta na cozinha de casa. Após 15 anos trabalhando em farmácias de manipulação, aquilo não seria tão difícil. 

E pela primeira vez depois de muito tempo, as suas dores melhoraram muito. Tanto que ela ficou até assustada. “Se me perguntam o que tinha naquele óleo? Eu não sei”, conta. 

Conhecendo um mundo novo

Por causa dos resultados rápidos, a pesquisadora foi atrás de estudos ou qualquer informação além do que já tinha ouvido falar. Mas há oito anos, não existia muita coisa. O jeito foi recorrer à associações de pacientes.

“Eu fui conversar com o pessoal e acabei me envolvendo com uma associação e a partir disso, as associações começaram a me ajudar, a fornecer o óleo, eu não precisava mais fazer em casa. Em contrapartida, como eu sou farmacêutica, comecei a auxiliar as associações da melhor forma de extração, a gente fazia essa troca e é assim até hoje”, relata.

À medida que foi emergindo nesse universo novo, ela passou a participar da elaboração de cursos e ajudar outras entidades que cultivam e formulam o óleo. 

Mas sentia que ainda faltavam mais pesquisas, então decidiu ela mesma propor estudos sobre o assunto. Precisou bater na porta das universidades durante três anos, para finalmente conseguir uma bolsa de mestrado na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) para estudar a raiz da cannabis.

Câncer no Intestino 

Mas a sua história não acabou ali, ainda havia mais um desafio para enfrentar. Se antes a farmacêutica havia ouvido falar sobre os benefícios da planta através de pacientes com câncer, agora a cannabis era mais que necessária.  

A descoberta do câncer no intestino foi bem recente. Dalla soube em março deste ano enquanto fazia exames de rotina. Já estava avançado e a única saída era a remoção total do órgão.

Mas, diferente do que aconteceu nas outras cirurgias, o seu pós-operatório foi melhor do que se imaginava. No mesmo dia, ela já estava em casa cozinhando e com 30 dias, já estava na esteira da academia.  

Por outro lado, o fato não é uma surpresa. Algumas pesquisas já mostram os benefícios da cannabis para o pós-operatório. 

Em 2006, por exemplo, um estudo da Universidade Imperial de Londres já mostrava uma possível relação. Cerca de 65 pacientes receberam o óleo depois de cirurgias complexas, como a reposição do joelho. O extrato da cannabis foi capaz de diminuir as dores do pós-operatório.

“Hoje eu olho para trás e vejo que tudo isso aconteceu porque eu sinto dor. Eu sou farmacêutica, pesquisadora, mas acima de tudo eu sou paciente”, conclui. 

Consulte um profissional

É importante ressaltar que qualquer produto feito com a cannabis precisa ser prescrito por um profissional de saúde habilitado, que poderá te orientar de forma específica e indicar qual o melhor tratamento para a sua condição.

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